A Europa volta a olhar para África: reflexões sobre a cimeira UA-EU

A próxima Cimeira União Africana–União Europeia, marcada para os dias 24 e 25 de novembro de 2025 em Luanda, representa um momento decisivo na redefinição da parceria entre os dois continentes.

O encontro, que reunirá 76 chefes de Estado e de Governo, assinala 25 anos de cooperação institucional e simboliza a maturidade necessária para transformar a relação histórica entre África e Europa numa verdadeira parceria de iguais, que é a única fórmula para reestabelecer o bom relacionamento entre os dois blocos.

A sétima Cimeira UA–UE terá lugar em Angola, coincidindo com o jubileu dos **50 anos da independência angolana, o que confere ao evento um simbolismo adicional. Estarão presentes **49 líderes africanos e 27 europeus, com exceção dos Estados-membros da União Africana sob sanções. Esta será uma das maiores reuniões políticas internacionais já realizadas em solo angolano, consolidando o papel de Luanda como epicentro do diálogo intercontinental. Nesta medida, começa por ser uma vitória internacional para o Presidente da República João Lourenço que tem apostado numa aproximação externa à Europa, para além, e por cima, de Portugal.

O encontro pretende reafirmar a Visão Conjunta UA–UE para 2030, que estabelece metas comuns em áreas como prosperidade económica, desenvolvimento humano, governação democrática, proteção ambiental e defesa do multilateralismo. A agenda inclui temas centrais como paz e segurança regional, integração económica, comércio, reforma das instituições multilaterais, digitalização, migração e mobilidade.

Neste aspeto, a Visão Conjunta ainda é demasiado europeia e pouco africana, atendendo sobretudo à ótica eurocêntrica na forma como encara o mundo, ainda sendo necessário um trabalho mais intenso de miscigenação de culturas e objetivos políticos para se transformar numa verdadeira Visão Conjunta.

Contudo, é positivo que retoricamente a Europa regresse a África não apenas como investidor, mas como parceiro estratégico.

O Global Gateway programa europeu de investimento em infraestruturas, prevê 150 mil milhões de euros destinados a projetos estratégicos em África. Este pacote financeiro é mais do que um gesto de cooperação: é uma tentativa de equilibrar a crescente disputa internacional pela influência no continente, marcada pela presença da China, Rússia, Turquia e países do Golfo. O grande desafio é concretizá-lo e traduzi-lo em dinheiro real, e não em promessas ou engenharias financeiras.

Ao contrário das dinâmicas coloniais do passado, a Europa procura agora afirmar-se como parceiro de confiança, apoiando a integração regional africana e promovendo mecanismos transparentes de acompanhamento. O Parlamento Europeu tem insistido na necessidade de uma parceria de iguais, assente em solidariedade, democracia e direitos humanos.

Esta mudança de paradigma revela uma maturidade política que reconhece a autonomia africana e valoriza a cooperação em pé de igualdade. Sem esta mudança, a Europa definharia em África.

O pós-colonialismo africano foi marcado por tensões, dependências e desconfianças. Contudo, a Europa pode desempenhar um papel positivo ao reconhecer os erros históricos e investir na construção de instituições sólidas com modelos escolhidos por África.

Além disso, a cooperação no domínio da transformação digital e da transição ecológica oferece oportunidades para superar desigualdades estruturais.

A aposta em energias renováveis, mobilidade sustentável e digitalização pode transformar África num ator central da economia verde global. A Europa, com a sua experiência regulatória e tecnológica, pode apoiar este processo sem impor modelos externos, mas adaptando-os às realidades locais.

A maturidade da relação UA–UE exige responsabilidade partilhada. África deve assumir o protagonismo na definição das suas prioridades, enquanto a Europa deve abandonar qualquer vestígio de paternalismo.

A cimeira de Luanda será um teste à capacidade dos dois blocos de negociar em pé de igualdade, respeitando as especificidades regionais e culturais.

Persistem desafios enormes, nomeadamente na gestão da migração e na criação de mecanismos de financiamento sustentável para projetos africanos. Há uma tendência política na Europa de voltar a humilhar os africanos. Isso tem de ser ultrapassado.

O comércio entre África e Europa continua a crescer. Em 2024, o volume de trocas comerciais ultrapassou os 300 mil milhões de euros, com destaque para setores como energia, minerais estratégicos e produtos agrícolas.

A Europa é ainda o maior parceiro comercial de África, representando cerca de 30% das exportações africanas. Este peso económico confirma que a UE continua a ser um ator central na economia africana, mesmo num cenário de diversificação de parcerias.

A Cimeira UA–UE em Luanda pode não ser apenas um encontro diplomático: mas um marco histórico na redefinição das relações entre África e Europa.

Ao reunir 76 líderes e ao mobilizar investimentos de 150 mil milhões de euros, o evento demonstra que a Europa regressa como parceiro real, disposto a assumir responsabilidades no pós-colonialismo e a apoiar o desenvolvimento africano em pé de igualdade. A maturidade desta relação será medida pela capacidade de transformar compromissos em resultados concretos, respeitando a autonomia africana e promovendo uma cooperação transparente e sustentável.

Num mundo marcado por disputas geopolíticas, a parceria UA–UE pode tornar-se um modelo de cooperação intercontinental, baseado em confiança, solidariedade e visão partilhada para 2030. Luanda, em novembro de 2025, será o palco onde se testará essa ambição.