A economia angolana e a necessidade de uma nova Constituição

As constituições não resolvem problemas, mas dão sinais poderosos. É dum desses sinais poderosos que a economia de Angola necessita, neste momento.

Se olharmos para os grandes dados macroeconómicos, deparamos com um quadro animador. A inflação desde março de 2022 desceu de 27,66% para 13,86%, em dezembro de 2022, um dado impressivo, o Kwanza, moeda nacional, oscila livremente no mercado internacional, o Orçamento Geral do Estado apresenta um excedente, a dívida pública desceu assinalavelmente, para um valor próximo dos 60% do PIB. A economia voltou a crescer na órbita dos 3% em 2022, prevendo-se um aumento de 2,7% em 2023. Entretanto, o petróleo continua em alta, a 86,27 o barril/Brent (25-01-2023).

Portanto, aqueles que se podem considerar os “fundamentais” da economia angolana encontram-se saudáveis, depois de uma longa penúria começada em 2015/2016.

No entanto, o investimento internacional que devia fluir para Angola ainda não é uma realidade, e a ameaça de instabilidade é latente, como demonstra a entrevista do líder da oposição Adalberto da Costa Júnior a um jornal português[1] na passada semana, não reconhecendo resultados eleitorais, tribunais e, pelo que se apreende qualquer instituição do Estado; na prática, assumindo como possível uma tomada de poder pela força.

Consequentemente, temos um trabalho de estabilização económica meritório que por razões políticas, e também aquelas que Keynes denominava “animal spirits” (emoções que determinam o comportamento humano), não produz os efeitos desejados e descritos habitualmente nos manuais de economia.

Ora, é precisamente esta necessidade de deslanchar do “animal spirit” que não se move na economia angolana e as ameaças de instabilidade política que originam a premência da discussão de uma nova constituição para Angola.

É sabido que a constituição angolana aprovada em 2010 não é consensual e foi desenhada numa alfaiataria jurídica tendo em conta a figura de José Eduardo dos Santos, introduzindo, aquilo que Jorge Miranda, o famoso constitucionalista português, apelidou de “sistema de governo representativo simples, a que, configurações diversas, se reconduziram a monarquia cesarista francesa de Bonaparte, a república corporativa de Salazar segundo a Constituição de 1933, o governo militar brasileiro segundo a Constituição de 1967-1969, vários regimes autoritários africanos.”[2]

Embora tendo sofrido uma revisão num sentido mais democratizante e aberto em 2021, em que se destaca a autonomização do Banco Central e a criação de um sistema constitucional de fiscalização do poder executivo por parte do legislativo, o certo é que a génese constitucional impede sempre que esta seja um símbolo duma sociedade aberta e uma economia livre e por outro lado, não contém mecanismos de proteção constitucional à semelhança dos propostos por Karl Loewenstein e adotados na Lei básica alemã do pós-guerra. Estes mecanismos protegem a constituição de ameaças internas à própria constituição e são um elemento fundamental para a estabilidade política.

Acresce que é importante reforçar os mecanismos de defesa do investimento privado e estrangeiro. Se repararmos, o investimento privado apenas é mencionado uma vez na constituição no artigo 38.º, e a história de oportunismo e verdadeiros “roubos” de investidores estrangeiros em Angola foi uma realidade que obriga a uma especial atenção normativa. Também as disposições sobre a terra (artigo 15.º) têm de ser atualizadas e racionalizadas, bem como a garantia da justiça com julgamentos rápidos e imparciais.

A justiça é reconhecidamente um dos aspetos essenciais de um bom funcionamento da economia, esperando-se decisões previsíveis e em tempo útil. Não existem dúvidas que o sistema judicial angolano necessita de um grande “aggiornamento” que seria introduzido por uma nova constituição.

Numa mera perspetiva económica, vê-se assim que uma nova constituição seria um sinal, um símbolo de um novo tempo que atrairia investidores e daria esperanças de estabilidade política e legal.

Como se mencionou no início, uma nova constituição não resolve todos os problemas, o seu papel é de anúncio de uma nova época aberta ao investimento, à economia de mercado e ao progresso e desenvolvimento do país. Seria o culminar das reformas económicas encetadas recentemente.


[1] Adalberto da Costa Júnior, 2023, Nascer do Sol, https://sol.sapo.pt/artigo/790625/houve-muita-pressao-para-tomar-as-instituicoes

[2] Jorge Miranda, A Constituição de Angola de 2010, CJP-CIDP, p. 42

Gabinete de Estudos CEDESA