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A Viragem da Diplomacia Pública Chinesa: Direitos Humanos como Ferramenta Estratégica e as Implicações para África e Angola

Rui Verde

Nota prévia: O CEDESA não pretende aprovar nem desaprovar as opiniões expressas neste texto. Essas opiniões devem ser consideradas como pertencentes ao autor.

A revolução dos paradigmas

Pelos menos desde o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que os Estados Unidos da América representavam um paradigma, o da chamada civilização Ocidental que afirmava a liberdade, a democracia, os direitos fundamentais e a economia livre. Eram uma espécie de “farol” para que os outros países olhavam e se inspiravam. Não quer isto dizer que o comportamento dos EUA fosse perfeito ou imaculado. Erros e tragédias aconteceram, Vietnam, Iraque, apoio a ditadores, hesitações espúrias, mas no final do dia, os EUA eram vistos como uma “força para o bem” e, sobretudo, traduziam um paradigma de sociedade que se ambicionava[1].

A partir de dada altura já no século XXI, esse papel dos EUA começou a ser posto em dúvida. Na realidade, os próprios EUA começaram uma espécie de autocrítica e entraram numa dúvida persistente sobre o seu papel, sobre a real existência do conceito de Ocidente, acerca da sua história, do seu sentido, mesmo do que era ser americano. Enfim, sobre tudo, e, como predisse Schumpeter, o sistema começou-se a desmoronar[2]. Este relativismo ou mesmo niilismo abriu as portas à eleição de Donald Trump que acabou com as ilusões. Trump vê-se como uma espécie de “ditador eleito” com um mandato popular para preencher o vácuo do relativismo e do niilismo intelectual que se tinha apoderado dos EUA, mas sem uma noção estratégica, a não ser fazer o que quer, descurando o papel paradigmático estabilizador internacional dos Estados Unidos. Não o entende, ou não o quer entender. Portanto, abriu a porta para outros ocuparam o espaço internacional deixado livre pelos EUA.

A China, sábia e atenta, está a aproveitar. Em primeiro lugar, tornou-se a defensora do comércio livre e da sociedade internacional organizada segundo regras, papel anteriormente promovido e ocupado pelos Estados Unidos[3].

Agora faz uma entrada na área da defesa dos Direitos Humanos, que deixa muitos surpreendidos.

A publicação do relatório chinês sobre as violações dos direitos humanos nos Estados Unidos em 2024, The Report on Human Rights Violations in the United States in 2024, representa uma mudança significativa na diplomacia pública da China. Tradicionalmente[4], Beijing tem rejeitado a linguagem dos direitos humanos como uma imposição Ocidental e uma forma de ingerência nos seus assuntos internos. No entanto, ao adotar essa mesma linguagem para criticar os Estados Unidos, a China sinaliza uma reconfiguração estratégica da sua atuação internacional, indo desafiar os Estados Unidos no seu habitual campo de eleição.

Esta viragem não implica uma adesão chinesa aos valores liberais, mas sim uma apropriação instrumental dos direitos humanos como ferramenta de influência geopolítica e narrativa.

A mudança ocorre num contexto de retração da liderança moral americana, especialmente com a presidência de Donald Trump, cuja política externa retirou qualquer relevância aos direitos humanos em favor de abordagens transacionais e nacionalistas. A China aproveita este vazio para ocupar um espaço simbólico que antes era hegemonicamente americano, com possíveis repercussões profundas nas suas relações com o continente africano.

A Diplomacia Pública Chinesa: De Defesa à Denúncia

Durante décadas, a China posicionou-se como defensora da soberania nacional e da não interferência, rejeitando críticas ocidentais sobre direitos humanos como tentativas de desestabilização. A sua diplomacia pública era marcada por uma postura defensiva, centrada em justificar o seu modelo político e económico como alternativa legítima ao liberalismo ocidental. No entanto, a publicação do relatório acima referido revela uma nova abordagem. O documento, detalhado e abrangente, denuncia práticas como a manipulação eleitoral, a violência policial, o racismo sistémico, a crise dos sem-abrigo, a degradação das condições de vida dos migrantes e a persistência de desigualdades estruturais nos EUA.

Este tipo de relatório não é novo — a China tem publicado documentos semelhantes desde 1998 — mas o grau de sofisticação, abrangência e timing político do relatório de 2024 sugere uma mudança qualitativa. Ao invés de apenas responder às críticas, Beijing passa a atacar proactivamente, utilizando os direitos humanos como arma retórica. Esta mudança insere-se numa estratégia mais ampla de contra narrativa, em que a China procura deslegitimar a autoridade moral dos Estados Unidos e apresentar-se como alternativa ao desnorte Ocidental.

O Vazio Americano: A Era Trump e o Desalinhamento Moral

A oportunidade para esta viragem surge num momento de enfraquecimento da liderança moral americana. Com a presidência de Donald Trump os direitos humanos deixaram de ser prioridade na política externa dos EUA. O governo Trump cortou financiamento a organismos internacionais, retirou-se de acordos multilaterais e adotou uma abordagem transacional nas relações bilaterais, privilegiando interesses económicos de curto-prazo em detrimento de valores normativos. Esta postura está a influenciar definitivamente a política externa, com uma crescente fadiga diplomática e polarização interna que minam a capacidade dos EUA de se apresentarem como paladinos  modelo liberal e  democrático[5].

O relatório chinês capitaliza precisamente sobre este contexto. Ao destacar as falhas sistémicas dos EUA — como a manipulação dos distritos eleitorais, a exclusão de minorias do processo democrático, a violência policial e a crise dos sem-abrigo — Beijing procura minar a autoridade moral americana e apresentar-se como voz crítica da ordem liberal. Esta estratégia não visa substituir os EUA como defensora dos direitos humanos, mas sim deslegitimar o discurso ocidental e reforçar a ideia de que nenhum país tem o monopólio da virtude.

Direitos Humanos como Ferramenta de Soft Power Chinês

A apropriação da linguagem dos direitos humanos pela China insere-se numa lógica de soft power, em que a construção de narrativas e perceções se torna tão importante quanto o poder económico ou militar. Ao denunciar os abusos nos EUA, Beijing vai influenciar a opinião pública internacional, especialmente nos países do Sul Global, onde o ressentimento contra o paternalismo Ocidental é mais forte. Esta estratégia visa criar um espaço discursivo em que a China possa apresentar-se como parceira respeitadora da soberania, mas também como crítica legítima das falhas do modelo liberal.

Este tipo de diplomacia pública tem precedentes. A China tem investido em meios de comunicação internacionais como a CGTN, em institutos Confúcio, em parcerias académicas e em campanhas de comunicação digital para moldar perceções globais. A introdução dos direitos humanos como tema central dessas campanhas representa uma evolução significativa, que pode ter implicações concretas nas relações bilaterais, especialmente em contextos de tensão ou conflito.

O continente africano é um dos principais palcos da influência chinesa. Desde o início do século XXI, a China tem intensificado a sua presença em África através de investimentos em infraestruturas, comércio, cooperação técnica e diplomacia cultural[6]. Esta relação tem sido marcada por uma abordagem pragmática, em que Beijing evita condicionar a cooperação ao respeito pelos direitos humanos, ao contrário dos países ocidentais. Esta postura tem sido bem recebida por muitos governos africanos, que valorizam a não interferência e a previsibilidade das relações com a China.

No entanto, a nova abordagem chinesa pode alterar este equilíbrio. Ao introduzir a linguagem dos direitos humanos na sua diplomacia pública, mesmo que seletivamente, Beijing pode começar a usar esse discurso como instrumento de pressão ou justificação.

Em relações que correm mal — por exemplo, em casos de incumprimento de contratos, instabilidade política ou críticas públicas — os direitos humanos podem emergir como argumento retórico, poderá ser o caso com Angola. Ainda que não se traduzam em sanções ou condicionamentos formais, estas narrativas podem influenciar perceções públicas, reputações governamentais e dinâmicas diplomáticas.

Além disso, a apropriação da linguagem dos direitos humanos pela China pode gerar ambivalência entre os parceiros africanos. Por um lado, pode reforçar a legitimidade da China como ator global responsável. Por outro, pode criar desconforto entre regimes autoritários ou sem tradição democrática, que até agora viam Beijing como parceiro silencioso. Esta ambivalência pode abrir espaço para novas negociações, reequilíbrios e até concorrência entre modelos de cooperação.

A viragem da China insere-se numa batalha mais ampla pelas narrativas globais. Os direitos humanos, longe de serem apenas valores universais, são também instrumentos de poder simbólico. Ao denunciar os abusos nos EUA, Beijing procura reverter a lógica tradicional em que os países ocidentais criticam o Sul Global. Esta inversão tem efeitos discursivos importantes: relativiza as críticas ocidentais, reforça a ideia de multipolaridade e legitima a China como ator normativo, isto é, criador de regras globais.

O caso de Angola

O recente interesse da China pelos direitos humanos em Angola pode ser interpretado sob três prismas distintos, cada um com implicações políticas e diplomáticas bastante diferentes. A forma como este movimento será recebido e explorado dependerá não apenas das intenções chinesas, mas também da capacidade angolana de gerir a sua imagem internacional num momento de tensão interna.

Num primeiro cenário, este novo posicionamento da China pode ser simplesmente ignorado por Angola e pela comunidade internacional, sendo visto como parte da habitual disputa geopolítica entre Pequim e Washington. Neste caso, os direitos humanos seriam apenas um instrumento retórico usado pela China para se contrapor às críticas ocidentais, sem qualquer impacto real sobre a situação angolana. Angola, por sua vez, poderia optar por não se envolver, tratando o tema como um assunto externo, sem relevância direta para a sua política interna ou para as suas relações bilaterais com a China.

Num segundo movimento possível, o governo angolano pode aproveitar esta nova retórica chinesa para se reaproximar de Pequim, apresentando a China como uma parceira que também valoriza os direitos humanos — ainda que sob uma definição própria e muitas vezes divergente dos padrões ocidentais. Esta estratégia permitiria a Angola suavizar a sua imagem internacional, especialmente num momento em que o país volta a ser alvo de críticas severas devido à repressão violenta de protestos em julho de 2025, que resultaram em várias mortes. Ao alinhar-se com uma China que se mostra mais vocal sobre direitos humanos, o governo angolano poderia tentar neutralizar parte da pressão internacional, sem necessariamente implementar reformas profundas.

Por fim, há uma terceira hipótese, mais ousada e potencialmente transformadora: a China pode decidir adotar uma postura mais ativa na política interna angolana, apoiando uma transição de governo que favoreça lideranças mais comprometidas com os direitos humanos. Este movimento, embora improvável à primeira vista, não pode ser descartado, sobretudo num contexto em que as relações entre Angola e China estão em processo de recalibração. Se Beijing entender que a estabilidade angolana — e, por extensão, os seus interesses estratégicos e económicos no país — dependem de uma maior abertura política e respeito pelos direitos fundamentais, pode vir a exercer influência nesse sentido, mesmo que de forma discreta.

Cada uma dessas possibilidades revela não apenas os contornos da diplomacia contemporânea, mas também os limites e as oportunidades que se abrem para Angola num momento de escrutínio internacional e redefinição de alianças. O modo como o governo angolano responder a este novo interesse chinês poderá determinar o rumo das suas relações externas e, talvez, o futuro da sua própria governabilidade.

Conclusão: Uma Nova Era de Diplomacia Pública

A publicação do relatório sobre os EUA em 2024 marca uma nova era na diplomacia pública chinesa. Ao apropriar-se da linguagem dos direitos humanos, Beijing não se torna liberal, mas sim mais estratégica. Esta mudança insere-se numa lógica de competição narrativa, em que os direitos humanos deixam de ser monopólio Ocidental e passam a ser campo de disputa simbólica. Para África, esta mudança pode ter implicações profundas, alterando perceções, dinâmicas diplomáticas e equilíbrios de poder. A China não abandona o pragmatismo, mas acrescenta uma nova camada discursiva à sua atuação internacional — uma camada que pode redefinir o futuro das relações Sul-Sul e da ordem global.

Em relação a Angola, o novo interesse da China pelos direitos humanos pode ser interpretado como uma oportunidade estratégica com múltiplas leituras: ignorado como parte da rivalidade sino-americana, aproveitado pelo governo angolano para melhorar sua imagem internacional, ou até como um sinal de que Pequim poderá influenciar uma transição política angolana mais alinhada com valores de direitos humanos. Num momento em que Angola enfrenta críticas renovadas pela repressão violenta de julho de 2025 e as suas relações com a China passam por uma fase de recalibração, a forma como este gesto será recebido poderá ter implicações profundas para o futuro político e diplomático do país.


[1] Judt, T. (2005), Postwar: A History of Europe Since 1945. New York: Penguin Press,

[2] Schumpeter, J. A. (1942). Capitalism, socialism and democracy. New York: Harper & Brothers.

[3] Observador. (2024, dezembro 16). Guerra comercial entre China e União Europeia resultará em perdas para ambos, diz ministro dos Negócios Estrangeiros chinês. https://observador.pt/2024/12/16/guerra-comercial-entre-china-e-uniao-europeia-resultara-em-perdas-para-ambos-diz-ministro-dos-negocios-estrangeiros-chines/

[4] State Council Information Office of the People’s Republic of China. (2025, August 17). The report on human rights violations in the United States in 2024. https://en.people.cn/n3/2025/0818/c90000-20353810.html

[5] Ver o nosso anterior relatório: https://www.cedesa.pt/2025/07/22/angola-e-a-administracao-trump-entre-a-trump-organization-e-a-diplomacia-do-desinteresse/

[6] Alden, C. (2007). China in Africa. London: Zed Books.

Angola e a Administração Trump: Entre a Trump Organization e a diplomacia do desinteresse

Com o regresso de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, Angola encontra-se perante um dilema estratégico que exige uma abordagem realista e desprovida de ilusões. A relação entre os dois países, que conheceu avanços significativos durante a administração Biden — nomeadamente com o investimento no Corredor do Lobito e o reconhecimento de Angola como parceiro estratégico[1] — está agora sujeita à lógica transacional e imprevisível que caracteriza o estilo político de Trump.

A ausência de uma estratégia americana para África

É fundamental reconhecer que os Estados Unidos, sob Trump, deixaram de ter uma estratégia coerente para África. A política externa americana tornou-se errática, centrada em interesses imediatos e pessoais, sem uma visão de longo prazo para o continente. É expectável que, sob a liderança de Trump, os Estados Unidos privilegiem acordos comerciais pontuais, com especial incidência nos setores da exploração de petróleo e mineração. Esta abordagem revela um desinteresse pelas dinâmicas africanas e uma preferência por relações bilaterais que favoreçam diretamente os interesses empresariais do presidente.

O certo é que a política externa dos Estados Unidos para África, sob a liderança de Donald Trump, revela uma ausência preocupante de estratégia, profundidade e compromisso institucional. Ao contrário de administrações anteriores que, mesmo com limitações, procuravam articular uma visão geopolítica para o continente africano, a atual abordagem caracteriza-se por superficialidade, centralização excessiva e desinteresse sistémico.

Um dos sinais mais evidentes dessa desarticulação é a falta de nomeações diplomáticas relevantes. Até julho de 2025, a administração Trump ainda não havia preenchido cargos-chave relacionados com África, incluindo o Subsecretário de Estado para Assuntos Africanos e o Embaixador junto da União Africana¹. Esta lacuna institucional compromete a capacidade dos EUA de manter diálogo estruturado com os países africanos e de responder a crises regionais com eficácia[2].

Além disso, a estrutura diplomática americana está a ser desmantelada. A administração anunciou o encerramento de várias embaixadas e consulados considerados “não essenciais” na África Subsaariana, com o objetivo de reduzir custos e concentrar recursos em regiões consideradas prioritárias. Esta decisão, aliada à extinção de gabinetes temáticos dedicados a direitos humanos, democracia e alterações climáticas, representa um recuo significativo na presença diplomática americana no continente.

A centralização da política africana no Gabinete do Enviado Especial para Assuntos Africanos, subordinado diretamente ao Conselho de Segurança Nacional, em vez do Departamento de Estado, reforça a lógica de controlo político e enfraquece a diplomacia tradicional[3]. Esta mudança institucional reflete uma abordagem mais securitária e menos cooperativa, onde os interesses estratégicos imediatos se sobrepõem ao desenvolvimento sustentável e à estabilidade regional.

No plano da segurança, a nova doutrina americana para África baseia-se na “partilha de encargos”. O Comando Militar dos EUA em África (AFRICOM) anunciou que os países africanos devem assumir maior responsabilidade pela sua própria segurança, com os EUA a reduzirem a sua presença militar e a focarem-se em operações mais letais e pontuais. Esta reconfiguração implica a retirada de apoio logístico, tecnológico e formativo, afetando diretamente a capacidade dos países africanos de combater o extremismo violento e de manter a paz em zonas instáveis.

A política externa americana tornou-se, assim, transacional e oportunista. Em vez de promover parcerias estruturadas, os EUA, como referido, privilegiam acordos pontuais baseados em recursos estratégicos, como petróleo, gás natural e minerais raros.

Países como Angola podem beneficiar de negociações diretas, mas sem garantias de apoio em áreas humanitárias, educativas ou de saúde pública. Esta lógica de curto prazo compromete a construção de relações duradouras e coloca os países africanos numa posição vulnerável.

As implicações geopolíticas desta ausência estratégica são profundas. O vazio deixado pelos EUA está a ser rapidamente preenchido por potências rivais como a China e a Rússia, que intensificaram os seus investimentos em infraestrutura, segurança e formação militar em África[4].

Em suma, a política americana para África sob Trump carece de visão, continuidade e profundidade. A falta de nomeações, os cortes abruptos em programas essenciais e a abordagem transacional revelam uma postura de desinteresse que contrasta com o dinamismo de outras potências globais. África, portanto, enfrenta o desafio de se posicionar com autonomia, diversificar parcerias e exigir respeito estratégico — sem esperar por um “salvador” externo.

Face a este cenário, o que pode Angola fazer?

Hipótese 1: Manter relações institucionais e esperar: a diplomacia do desinteresse

Uma das opções mais sensatas que Angola pode adotar perante a nova administração Trump não é resistir nem confrontar, mas simplesmente ignorar. Trata-se de manter relações diplomáticas formais e funcionais com os Estados Unidos, sem investir energia política ou capital estratégico numa relação que, neste momento, não promete estabilidade nem reciprocidade. Em vez de tentar agradar ou de se proteger ativamente, Angola pode optar por mergulhar na sua própria agenda de desenvolvimento, diversificação de parcerias e afirmação regional, deixando os EUA à margem enquanto persistirem na sua deriva política.

Durante os anos 1980, Angola enfrentou uma pressão intensa por parte da administração Reagan, que apoiava abertamente a UNITA. Na altura, o país respondeu com resistência ativa, simbolizada pelo slogan “Reagan tira as mãos de Angola!”. Hoje, no entanto, o contexto é diferente: não há uma guerra ideológica, mas sim um vazio estratégico. A ausência de uma política americana coerente para África torna desnecessária qualquer forma de resistência. O que se impõe é o desinteresse calculado.

Ao manter uma postura institucional mínima — sem rupturas, mas também sem entusiasmo — Angola protege-se de envolvimentos que possam comprometer a sua soberania ou reputação internacional. Ignorar, neste caso, é uma forma de inteligência diplomática: não se trata de esperar por melhores dias, mas de não perder tempo com interlocutores que não têm uma proposta clara.

É verdade que esta abordagem pode implicar a perda de oportunidades de investimento imediato, sobretudo em setores como energia ou infraestruturas. Pode também significar uma certa marginalização nas prioridades comerciais dos EUA. No entanto, esses riscos são relativizados pela própria realidade americana: a ausência de uma estratégia para África torna qualquer esforço de aproximação irrelevante. Os Estados Unidos, sob Trump, não parecem interessados em manter relações estruturadas com o continente — e Angola não tem obrigação de preencher esse vazio.

Ao invés de tentar interpretar ou influenciar uma política externa errática, Angola pode concentrar-se em aprofundar relações com parceiros que demonstram compromisso e visão de longo prazo — como a União Europeia, a Índia, os países do Golfo e os blocos africanos. A diplomacia do desinteresse, neste caso, não é passividade: é foco.

Hipótese 2: Agradar aos interesses privados de Trump: pragmatismo comercial

A segunda hipótese é mais pragmática: Angola poderia oferecer oportunidades comerciais à Trump Organization, como forma de garantir atenção e investimento. Esta abordagem já foi adotada por países como o Qatar e o Vietname, com resultados concretos.

O Qatar ofereceu a Trump um Boeing 747 avaliado em 400 milhões de dólares, além de um projeto imobiliário da Trump Organization em Doha, aquando da visita de Trump ao país.

O envolvimento da Trump Organization no Vietname representa outro exemplo claro de como países podem adotar uma abordagem pragmática e comercial para cultivar relações com a administração Trump.

Em maio de 2025, foi lançada oficialmente a construção do Trump International Hung Yen, um megaempreendimento imobiliário e turístico avaliado em 1,5 mil milhões de dólares, localizado na província de Hung Yen, a sul de Hanói.Este projeto, desenvolvido em parceria com a Kinh Bac City Development Holding Corporation, cobre cerca de 990 hectares e inclui dois campos de golfe de padrão internacional, um hotel cinco estrelas, vilas de luxo e uma zona urbana moderna. A Trump Organization receberá 5 milhões de dólares em licenças de marca e assumirá a gestão do complexo após a sua conclusão, prevista para o segundo trimestre de 2029. Durante a cerimónia de lançamento, estiveram presentes Eric Trump, vice-presidente executivo da Trump Organization, e o Primeiro-Ministro vietnamita Pham Minh Chinh, que destacou o projeto como um marco na Parceria Estratégica Abrangente entre os EUA e o Vietname. O projeto foi descrito como um símbolo de excelência e compromisso com o desenvolvimento sustentável, com promessas de criação de empregos, transferência de tecnologia e promoção da imagem internacional do Vietname. Além disso, a Trump Organization está em negociações para desenvolver um arranha-céus em Ho Chi Minh City, na zona de Thu Thiem, o que reforça a intenção de expandir a presença da marca Trump no país[5].

O caso vietnamita mostra como um país pode “agradar” a Trump através de investimentos que envolvem diretamente a sua organização empresarial, garantindo visibilidade e benefícios económicos imediatos.

Para Angola, esta abordagem pode representar uma oportunidade estratégica para atrair investimentos diretos e imediatos em setores-chave como o petróleo, a mineração e o turismo. Ao estabelecer parcerias com a Trump Organization, Angola poderá beneficiar da visibilidade internacional da marca, impulsionar projetos de grande escala e posicionar-se como destino preferencial para investidores americanos. Esta aproximação pode também abrir portas a novas formas de cooperação económica, reforçando a presença angolana em mercados globais e diversificando as suas fontes de financiamento e desenvolvimento.

Considerações finais: entre o pragmatismo e a prudência

Angola deve reconhecer que os Estados Unidos, sob Trump, não têm uma estratégia para África. Como observou um anterior relatório da CEDESA, “há um absentismo americano em África”. Esta ausência de direção exige que Angola adote uma política externa mais calculista, orientada para os seus próprios interesses.

A chave está em equilibrar pragmatismo com prudência.

Num mundo pós-internacional, onde os tratados são ignorados e as alianças são fluidas, Angola deve posicionar-se como um ator soberano, capaz de negociar com firmeza e proteger os seus interesses. A relação com os Estados Unidos sob Trump não deve ser guiada por ilusões, mas por uma estratégia clara, pragmática e orientada para o desenvolvimento sustentável.


[1] Jornal Económico, Joe Biden será o primeiro presidente dos EUA a visitar oficialmente Angola, 2024. https://jornaleconomico.pt/noticias/joe-biden-sera-o-primeiro-presidente-dos-eua-a-visitar-oficialmente-angola-1098433

[2] Horn Review, Realigning Priorities: U.S.–Africa Policy Across Two Trump Presidencies, 2025. https://hornreview.org/us-africa-policy-trump-2025

[3] Idem

[4] African Security Analysis, As America Pulls Back, Russia and China Step In Across Africa, maio de 2025.

[5] The Independent – Vietnam fast-tracks $1.5B Trump golf resort amid tariff threats https://www.independent.co.uk/news/world/americas/us-politics/vietnam-trump-trade-tariffs-golf-course-b2757581.html

Angola and the New Post-International Order (of Trump and others)

1-For decades, there have been calls for a New World Order. Generally, these calls came from the so-called Third World countries at the time, and from left-wing intellectuals and ideologues who wanted a fairer, more united world, without so many financial rules and not based on the dictates of US capitalism.[1] In fact, an international order had been established at the Bretton Woods Conference and the San Francisco Conference (both in the United States) to create, respectively, the international financial structure and organizations and the United Nations from 1944/1945, with a view to creating a world in which international law was a reality and international relations were based on rules, the economy on free trade and peace was the ultimate goal of coexistence between peoples.

Despite many bumps in the road, this order based on rules, free trade and a trend towards globalization has endured, if not as a practice, at least as a paradigm or benchmark.

Everything began to change in the 2010s. In a number of countries, leaders with authoritarian tendencies emerged who understood that in order to develop their countries and give them the projection to which their size and history entitled them, they had to break with the internationalist paradigm of 1944/1945 and impose a revision of the world order.

This vision was not the solidarity-based and fair alternative of the past, but a reinvention of the power of the affirmative sovereign state with imperial tendencies that prevailed in the 19th century. A new paradigm of great powers in which the reference is their strength has once again taken shape. It was Putin in Russia, Xi Jinping in China, Modi in India, among others. All of them once again have as their main objective the emergence of their countries as great powers, and are willing to do this through the use of force, not necessarily military force, although in some cases it is also[2]

The United States and the European Union have not reacted to these attempts to change the international paradigm. They have remained complacent in advancing their agendas, which over time have become confused and irrational, mixing millenarian desires with destructive social engineering, betting on societies of leisure and consumption, with no benchmarks. Western electorates are beginning to react to the dysfunction of policies with their needs, and the extreme right is emerging in force in Europe and Trump in the United States. Trump’s first term could have been a blip. It wasn’t. His election in 2024 was the catalyst moment for the death of the international paradigm.

International relations can no longer be thought of as based on law, rules, respecting agreements or established facts. Alliances will change, countries’ interests and identities will be strengthened. Force will play a key role in re-establishing an international paradigm. Trump is leading the American reaction to this “death” of the 1944/1945 international system. And he is taking on board the new signs, already enunciated by Putin and Xi Jinping: international treaties are no longer relevant, alliances are changing, borders are not sacred, countries are not equal, democracy and free trade are not the only possible systems and certainly do not represent the end of history. Trump doesn’t hesitate to claim Greenland, Panama and even Canada. Just as Putin has already taken Crimea and is trying to take back Ukraine. When it will be Taiwan’s and China’s turn is unknown, but it all depends on calculations of strength and probability. This is the post-international system.

The European Union, also an essentially American creation in the post-war period, within the system devised for peace and prosperity by Acheson and Marshall, among others, did not understand the historical movements and above all did not understand from President Obama’s mandate onwards that it was no longer an American priority. Now, its creator (the USA) has withdrawn its support. It has to live for itself. It’s a dysfunctional structure with no unambiguous decision-making power in which countries with different interests live. The old European powers, Germany, France, the United Kingdom and perhaps Spain and Italy, will probably have to take over the running of affairs in an articulated way, but in which the national interest takes precedence, in order to reorient Europe.

2-Of course, this radical change in the international paradigm has very important implications for Africa, which are already being felt, and for Angola, which are not yet particularly visible, but will soon become so.

Recently, Africa seems to have returned to the 19th century and the time of the “race to Africa”. Its natural resources, its strategic position in the Global South, its demography, which is a sign of vitality for the future but also a threat of migration to Europe, and the persistent fragility of its institutions, have once again made the continent the target of interest and intervention by various external countries. Russia has set its sights on creating a belt of countries aligned in the Sahel, signing several military agreements, pushing ahead with the so-called Africa Corps (formerly Wagner) and planning to set up nuclear power plants with several African countries. It is possibly the most active power in Africa at the moment.[3] China is always more discreet, but its economic influence is growing and it is an essential partner for many African governments. Little is decided in Africa without China. As someone quoted a Vietnamese saying, China is “an oil slick that spreads without anyone noticing, but sticks to your feet[4] “. Other countries such as Turkey and the Persian Gulf countries are also making rapid strides in Africa, as is India, albeit more slowly.

The European Union has strong relations with Africa, it has several programs and realizes the importance of Africa, but it hesitates, between the problems that migration brings and the regulations it imposes on its companies, it drags its feet, without a defined strategy for Africa, it realizes that it is important, but it prevaricates. France used to dominate African affairs. It is now clearly losing its influence. The European decolonization complex also contributes to its ambiguous attitude[5] . Europe has the know-how and the funding, but it doesn’t leverage it enough

The United States seemed to realize what was happening with the Biden administration. They created a consistent strategy, returned to Africa, were developing projects and pairing up with the European Union, taking it out of its hesitations. Everything went downhill with Trump’s new mandate. The US has become absent, there is an American absenteeism in Africa.[6] Trump hadn’t even managed to get the African team set up by the end of March.

3-There have already been consequences of this new post-international paradigm in Africa, with an impact on Angola. The major advance by the combined forces of M23 and Rwanda to conquer Goma and Kivu in the east of the Democratic Republic of Congo (DRC), creating a clearly relevant intervention zone, took place after Trump took office, cementing the idea that the international order has changed and borders can be changed. The same effect may have been at the origin of the fact that Tshisekedi and Kagame left Angolan mediation to resolve their dispute and went to Qatar. Angola had the US as a support in this negotiation, which gave it negotiating strength. With Trump’s absenteeism, that Angolan advantage no longer exists – at least for now – and there is a strange appetite for holding talks in the Gulf countries. The war in eastern Congo is in danger of becoming even bigger. The American attitude is having effects that could be dramatic .[7]

In this sense, it must be emphasized that all of this has consequences for Angola. In the Second Congo War, Kagame was defeated with the Angolan contribution, and therefore has a “score to settle” with Angola. M23 won’t stop there and the Islamic Republic of East Africa is putting pressure on Cabo Delgado and possibly, according to some analysts, is already in Angola.[8]

In fact, the disruption of the international order and Trump’s absenteeism, which as we have seen is already having consequences in the DRC and the possible spread of Islam, have consequences for Angola, some at a political level and others at a security level.

On a political level, it is clear that the choices and adoption of democratic governance processes are strictly an Angolan matter. It is not and will not be the international community that imposes any political model. Clearly, the time of the end of history described by Francis Kukuyama[9] as democracy and a free economy is no more. Each country is left to its own devices. In fact, the very extinction of the Voice of America, which propagated these goals throughout the world, is the greatest example of this end. Don’t expect outside intervention in any way in the Angolan general elections in 2027. Those appeals to the international community no longer make any sense.

However, it is at the level of sovereignty, border definition and security that the greatest challenges for Angola arise in this new post-international order. A revisionist process of borders in Africa is underway. As we know, the borders in Africa after independence were largely inherited from the colonial period. During the Berlin Conference (1884-1885), the European powers divided the African continent among themselves, often ignoring local cultural, ethnic and geographical realities.

After independence, the Organization of African Unity (OAU) adopted the principle of uti possidetis juris, which stated that colonial borders should be maintained to avoid territorial conflicts. Over the years, there have only been two successful attempts to redefine borders, the creation of Eritrea in 1993 and South Sudan in 2011.

However, this principle of border stability is now being called into question. The M23 incursion with the support of Rwanda may want to establish new borders in the area. This will no longer depend on international law, but on force.

As a result, Angola’s borders are under threat, the call for secession of territories (Cabinda; Lundas?) will become stronger and the validity of the OAU declaration will be called into question. At the same time, migration caused by changes in other countries (DRC, for example) will put pressure on Angola’s borders. It is clear that this is also a time of threat to any country, by another that feels stronger, or that wants to sow instability as may be the case with Rwanda in relation to Angola or any Islamic republic proclaiming .[10]

In this sense, it would be useful for Angolan security to think about creating external perimeters as buffers to stabilize and maintain territory, especially in the event of serious upheaval in DRC territory, from the most sensitive areas, such as Cabinda and the Lundas, huge border lines with potential sources of danger.

The ongoing redefinition of the international system will inevitably lead Angola to a need to strengthen its internal unity and possibly to increase (and revise) its national security doctrine in order to combat threats to the stability of the state and its borders. 


[1] For example, Antônio Carlos Wolkmer, 1989, The third world and the new international order

[2] Michael Kimmage, (2025) The World Trump Wants, Foreign Affairs. March/April 2025, Vol.104. N.2.

[3] Eugénio Costa Almeida, speech at the CEDESA dinner-debate on March 25, 2025.

[4] Maria José de Melo, IDEM above.

[5] IDEM.

[6] Rui Verde, speech at the CEDESA dinner-debate on March 25, 2025.

[7] IDEM

[8] Eugénio Costa Almeida, cit.

[9] Francis Fukuyama, 1992, The End of History and the Last Man,

[10] Eugénio Costa Almeida, IDEM.

Angola e a Nova Ordem pós-Internacional (de Trump e outros)

1-Durante décadas, clamou-se por uma Nova Ordem Mundial. Geralmente, tais apelos vinham dos então chamados países do Terceiro Mundo, e de intelectuais e ideólogos de esquerda, que pretendiam um mundo mais justo e solidário, sem tantas regras financeiras e não assente nos ditames do capitalismo norte-americano.[1] Na verdade, uma ordem internacional tinha sido estabelecida a partir da Conferência de Bretton Woods e da Conferência de São Francisco (ambas nos Estados Unidos) para criação respetivamente da estrutura e organizações financeiras internacionais e das Nações Unidas a partir de 1944/1945, com vista a criar um mundo em que o direito internacional fosse uma realidade e as relações internacionais assentassem em regras, a economia em trocas livres e a paz fosse o objetivo último da coexistência entre os povos.

Apesar de imensos solavancos, esta ordem baseada em regras, no comércio livre e numa tendencial globalização foi perdurando, senão como prática, pelo menos como paradigma ou referência.

Tudo começou a mudar a partir dos anos 2010s. Numa série de países irromperam líderes com tendências autoritárias que entenderam que para desenvolver os seus países e lhes dar a projeção a que o seu tamanho e história davam direito, tinham de romper o paradigma internacionalista de 1944/1945 e impor uma revisão da ordem do mundo.

Essa visão não foi a alternativa solidária e justa dos alternativos do passado, mas uma reinvenção do poder do Estado soberano afirmativo com tendências imperiais que vigorou no século XIX. Um novo paradigma de grandes potências em que a referência é a sua força voltou a tomar forma. Foi Putin na Rússia, Xi Jinping na China, Modi na Índia, entre outros. Todos voltaram a ter como principal objetivo a emergência dos seus países como grandes potências, dispondo-se a fazer tal com o uso da força, não necessariamente militar, embora nalguns casos também[2].

Os Estados Unidos e a União Europeia não reagiram as estas tentativas de mudar o paradigma internacional, continuaram complacentes a avançar as suas agendas, que com o tempo se tornaram confusas e irracionais, misturando anseios milenaristas com engenharias sociais destrutivas, apostando em sociedades de lazer e consumo, sem referenciais. Os eleitorados ocidentais começam a reagir à disfunção das políticas com as suas necessidades e surgem as extremas-direitas em força na Europa e Trump nos Estados Unidos. O primeiro mandato de Trump poderia ter sido um blip. Não foi. A sua eleição em 2024, representou o momento catalisador da morte do paradigma internacional.

Não se podem pensar mais as relações internacionais como baseadas no direito, em regras, respeitando acordos ou factos estabelecidos. As alianças vão mudar, os interesses dos países e as suas identidades vão ser reforçadas. A força vai desempenhar um papel fundamental no restabelecimento dum paradigma internacional. Trump lidera a reação americana a esta “morte” do sistema internacional de 1944/1945. E assume os novos sinais, já enunciados por Putin e Xi Jinping: os tratados internacionais são pouco relevantes, as alianças mudam, as fronteiras não são sagradas, os países não são iguais, a democracia e o comércio livre não são os únicos sistemas possíveis e certamente não representam a finalidade da história. Trump não hesita em reivindicar a Gronelândia, o Panamá e até mesmo o Canadá. Tal como Putin já tomou a Crimeia e tenta reaver a Ucrânia. Quando chegará a vez de Taiwan e da China, não se sabe, mas tudo já só depende de cálculos de força e probabilidade. Este é o sistema pós-internacional.

A União Europeia, também uma criação essencialmente americana no pós-guerra, dentro do sistema idealizado para a paz e prosperidade por Acheson e Marshall entre outros, não percebeu os movimentos históricos e sobretudo não entendeu a partir do mandato do Presidente Obama que já não era prioridade americana. Agora, o seu criador (os EUA) retiraram-lhe o apoio. Tem de viver por si. Dificilmente o fará, é uma estrutura disfuncional sem poder de decisão unívoco em que vivem países com interesses diferentes. Provavelmente, as velhas potências europeias, Alemanha, França, Reino Unido e talvez Espanha e Itália, vão ter de assumir a direção dos negócios de forma articulada, mas em que o interesse nacional é preferencial, para reorientarem a Europa.

2-Obviamente, que esta mudança radical de paradigma internacional tem implicações muito relevantes para África, que já se estão a notar, e para Angola, ainda não especialmente visíveis, mas que se tornarão em breve.

Recentemente, África parece retornada ao século XIX e ao tempo da “corrida para África”. Os seus recursos naturais, a sua posição estratégica no Sul Global, a sua demografia que constitui um sintoma de vitalidade para o futuro, mas também uma ameaça de migração para a Europa e a persistente fragilidade das suas instituições, tornaram o continente, de novo, alvo do interesse e intervenção de vários países externos. A Rússia apostou na criação dum cinturão de países alinhados no Sahel, assinando vários acordos militares, fazendo avançar o dito Africa Corps (ex Wagner) e prevendo com vários países africanos a instalação de centrais nucleares. Possivelmente, neste momento, será a potência mais ativa em África.[3] A China é sempre mais discreta, mas a sua influência económica alastra e é parceiro essencial de muitos governos africanos. Já pouco se decide em África sem a China. Como alguém citou referindo um dito vietnamita, a China é “uma mancha de óleo que se alastra sem ninguém notar, mas que se cola aos pés[4]”. Outros países como a Turquia e os países do golfo Pérsico também dão passos acelerados em África, tal como a Índia, embora mais lenta.

A União Europeia tem fortes relações com África, tem vários programas e percebe a importância de África, mas hesita, entre os problemas que as migrações lhe trazem e as regulações que impõe às suas empresas, arrasta-se, sem uma estratégia definida para África, percebe que é importante, mas tergiversa. A França é que dominava os assuntos africanos. Neste momento, está nitidamente a perder a sua influência. O complexo europeu da descolonização também contribui para a sua atitude ambígua[5]. A Europa tem know-how e financiamento, mas não o alavanca suficientemente.

Os Estados Unidos pareciam ter noção do que se passava com a administração Biden. Criaram uma estratégia consistente, voltaram a África, estavam a desenvolver projetos e a emparceirar com a União Europeia, retirando-a das hesitações. Tudo descambou com o novo mandato de Trump. Os EUA tornaram-se ausentes, há um absentismo americano em África.[6] Trump ainda nem tinha conseguido ter a equipa africana constituída no final de março.

3-Já houve consequências deste novo paradigma pós-internacional em África com reflexo em Angola. O grande avanço das forças combinados do M23 e do Ruanda para conquista de Goma e Kivu no Leste da República Democrática do Congo (RDC), criando uma zona de intervenção manifestamente relevante, ocorreu após a tomada de posse de Trump, sedimentando a ideia que a ordem internacional mudou e as fronteiras podem ser mudadas. O mesmo efeito poderá ter estado na origem do facto de Tshisekedi e Kagame terem saído da mediação angolana para resolver a sua contenda e terem ido para o Qatar. Angola tinha os EUA como suporte nesta negociação, o que lhe dava força negocial. Com o absentismo de Trump, tal vantagem angolana deixou-pelo menos por agora-de existir e há uma estranha apetência por realizar conversações nos países do Golfo. A Guerra no Leste do Congo corre o risco de se tornar ainda maior. A atitude americana está a originar efeitos que podem ser dramáticos[7].

Neste sentido, há que enfatizar que tudo isto tem consequências para Angola. Na Segunda Guerra do Congo, Kagame foi derrotado com o contributo angolano, e por isso tem “contas a ajustar” com Angola. O M23 não vai ficar por aqui e a República Islâmica da África Oriental está a pressionar Cabo Delgado e possivelmente, segundo alguns analistas, já estará implementada em Angola.[8]

Efetivamente, a disrupção da ordem internacional e o absentismo de Trump, que como se viu está já a ter consequências na RDC e no eventual alastramento islâmico, têm consequências para Angola, umas a nível político e outras a nível de segurança.

A nível político, torna-se evidente que as escolhas e a adoção de processo democráticos de governação são estritamente um assunto angolano. Não é, nem será a comunidade internacional a impor qualquer modelo político. Claramente, o tempo da finalidade da história descrita por Francis Kukuyama[9] como democracia e economia livre, deixou de o ser. Cada país está entregue a si próprio. Aliás, a própria extinção da Voz da América que propagava esses objetivos por todo o mundo, é o maior exemplo desse final. Não se esperem intervenções externas em qualquer sentido nas eleições gerais angolanas de 2027. Aqueles apelos que se faziam à Comunidade Internacional deixaram de fazer qualquer sentido.

Contudo, é a nível da soberania, definição de fronteiras e segurança que os maiores desafios colocados em relação a Angola surgem com esta nova ordem pós-internacional. Está em curso um processo revisionista das fronteiras em África. Como se sabe, as fronteiras em África após as independências foram, em grande parte, herdadas do período colonial. Durante a Conferência de Berlim (1884-1885), as potências europeias dividiram o continente africano entre si, muitas vezes ignorando as realidades culturais, étnicas e geográficas locais.

Após as independências, a Organização de Unidade Africana (OUA) adotou o princípio de uti possidetis juris que afirmava que as fronteiras coloniais deveriam ser mantidas para evitar conflitos territoriais. Ao longo dos anos, houve apenas duas tentativas relevantes de redefinir fronteiras bem-sucedidas, a criação da Eritreia em 1993 e do Sudão do Sul em 2011.

No entanto, este princípio de estabilidade fronteiriça está hoje colocado em causa. Possivelmente, a incursão do M23 com o apoio do Ruanda quererá estabelecer novas fronteiras na zona. Tal já não dependerá do direito internacional, mas da força.

Assim sendo, as fronteiras angolanas estão ameaçadas, surgirá com mais força o apelo a secessões de territórios (Cabinda; Lundas?) e a validade da declaração da OUA será colocada em causa. Ao mesmo tempo, as migrações provocadas por alterações noutros países (RDC, por exemplo) colocarão pressões nas fronteiras angolanas. Torna-se evidente que este é, também, um tempo de ameaça a qualquer país, por outro que se sinta mais forte, ou que queira semear instabilidade como pode ser o caso do Ruanda em relação a Angola ou qualquer república islâmica a proclamar[10].

Nesse sentido, tornar-se-ia útil pensar ao nível da segurança angolana criar perímetros externos como tampões de estabilização e manutenção do território, sobretudo no caso de grave convulsão no território da RDC, a partir das zonas mais sensíveis, como Cabinda e as Lundas, linhas fronteiriças enormes com potenciais fontes de perigo.

Forçosamente, a redefinição do sistema internacional em curso levará Angola a uma necessidade de reforço da sua unidade interna e possivelmente ao incremento (e revisão) da sua doutrina de segurança nacional para combater ameaças à estabilidade do Estado e às suas fronteiras. 


[1] A título de exemplo, Antônio Carlos Wolkmer, 1989, O terceiro mundo e a nova ordem internacional

[2] Michael Kimmage, (2025) The World Trump Wants, Foreign Affairs. March/April 2025, Vol.104. N.2.

[3] Eugénio Costa Almeida, intervenção no jantar-debate CEDESA a 25 de março de 2025.

[4] Maria José de Melo, IDEM supra.

[5] IDEM.

[6] Rui Verde, intervenção no jantar-debate CEDESA a 25 de Março de 2025.

[7] IDEM

[8] Eugénio Costa Almeida, cit.

[9] Francis Fukuyama,1992, O Fim da História e o Último Homem,

[10] Eugénio Costa Almeida, IDEM.

Jantar CEDESA de 25 de Março de 2025

Trump e África: Vitória da China e Rússia?

Decorreu no dia 25 de Março no Pestana Palace em Lisboa, o Jantar-Debate incluído nas comemorações dos 50 anos da Independência de Angola que o CEDESA leva a cabo durante este ano com o tema Trump e África: Vitória da China e Rússia?

Estiveram presentes académicos, jornalistas e empresários com ligações a Angola, um conjunto diverso de personalidades que debateu de forma viva e livre o tema, sem facciosismos e de maneira construtiva.

Tivemos um antigo deputado-coordenador do PSD na comissão dos Negócios Estrangeiros da Assembleia da República que moderou o debate, jornalistas da LUSA, Jornal de Negócios, Correio da Manhã, DW e RTP África, professores em universidades portuguesas e estrangeiras.

Notou-se um forte interesse no tema, destacando-se a intensificação dos esforços russos de estabelecimento em África através de acordos militares, a presença constante e pragmática da China, novos actores como a Índia e a Turquia, as possibilidades que se abrem para a União Europeia, e o absentismo dos EUA que já teve como consequência o incremento dos conflitos em África. A situação africana é instável, as fronteiras podem mudar e as guerras alastrar. Estas foram as principais conclusões.

As presenças foram mais ricas e oportunas.

Trump’s victory and Angola (quick analysis)

Donald Trump’s expectations and unpredictability

For any observer of Angolan politics, there seemed to be a certain domestic alignment in terms of sympathies for the American elections. Or to put it more explicitly, a hope on the part of the sectors antagonistic to João Lourenço that Donald Trump would win, in the expectation that he would repeat the policy of his first term of disinterest in Africa and therefore a cooling off towards Angola.

Now that victory has been won, it’s important to try to understand what may or may not happen, given that Angola’s new strategic alignment with the US is at stake, which has, in a way, balanced the balance of power on the African continent and also, specifically, relaunched the Lobito Corridor, a project that President Joe Biden has embraced intensely.

Obviously, before January 20, 2025, everything will be too speculative, and, above all, when it comes to Trump, unpredictability takes center stage.

Even so, there have been enough signs to suggest that Trump’s attitude towards Angola will not be so different from Joe Biden’s policy after all.

China’s competition and containment

The first reason for the policy’s permanence is China. From a geostrategic point of view, the current situation (2024) is extremely different from that of Trump’s first term (2017-2021), particularly with regard to competition or containment of China, which, it should be remembered, was initiated as a structural trend in US foreign policy, precisely by Donald Trump. Trump’s collection of speeches on China during his term “TRUMP ON CHINA – PUTTING AMERICA FIRST” is expressed in his introduction to the statement:

“For decades, Donald J. Trump was one of the few prominent Americans to recognize the true nature of the Chinese Communist Party and its threat to America’s economic and political way of life. Now, under President Trump’s leadership, the United States is taking action to protect our nation and its partners from an increasingly assertive China. We are no longer turning a blind eye to the People’s Republic of China’s conduct nor are we hiding our criticism of its Communist Party behind closed doors.”[1]

It is in this sense that some of Trump’s most prominent collaborators have spoken out. Tibor Nagy, Trump’s former Assistant Secretary of State for African Affairs and former Ambassador to Guinea and Ethiopia, insists that Trump was the first to raise awareness about the enormous threat that China poses to US interests in Africa, and expressly states: “You will again see an aggressive fight against Chinese influence in Africa “.[2]

Admittedly, the focus of this transactional approach, typical of Trump, will be to start blocking supply chains for essential minerals in Africa used for green energy batteries used in electric vehicles and phones. Thus states Ambassador J. Peter Pham, former US Special Envoy for the Sahel region of Africa under Trump, “There is no denying that access to the many critical minerals that Africa has in great abundance is necessary for the US economy today, as well as for the technologies that will take us into the future,” and “Moreover, the monopolization of supply chains for these strategic resources by any country, let alone a revisionist power like China, is a threat to US security.”

This geostrategic sense of Africa in which Angola fits is reinforced by the so-called Project 2025, a kind of parallel doctrine of Trumpist ideologues, from which he has departed in some respects, but not in relation to Africa. Kiron K. Skinner writes in that document that Africa’s explosive population growth, large reserves of minerals dependent on industry, proximity to the main maritime transportation routes and its collective diplomatic power guarantee the continent’s global importance .[3]

The truth is that one area of the Biden-Harris approach that has not been criticized by Republicans is the Lobito Corridor, the multi-billion dollar logistics and communications infrastructure project that connects the Port of Lobito in Angola to essential mineral mines in Zambia and the Democratic Republic of Congo. American observers of Africa see the project as a model to be built or replicated, mainly with the aim of taking back some control of essential mineral supply chains from China .[4]

Therefore, what emerges from a first analysis of the pronouncements of Trump’s allies and their own interests and stance towards China, is that Angola and its Lobito Corridor occupy a prominent place, and therefore, if Trump’s attention to China is maintained, Africa and especially Angola will be at a higher level of US strategic options, i.e. US interest in Angola will be maintained.

Business opportunities

A second aspect is Trump’s emphasis on numbers and business opportunities. It is likely that this time, thinking about Africa and Angola, he will see figures reflecting the massive movement of young people to the continent and opportunities for American business. It’s no secret that João Lourenço, albeit with modest success, has been trying to open up Angola to world business, making the country an attractive location for foreign investment. It’s a long road. However, Trump may see a market for US exports here, as Biden has already seen in telecommunications and solar energy .[5]

Conclusions

With all the caution that Trump’s unpredictability advises, as well as his previous contempt for the African continent has shown, it should not be anticipated that there will be a cooling in the rapprochement between Angola and the United States after January 20, 2025.

In fact, what has been at stake on the US side is not any friendship or personal relationship between Joe Biden and João Lourenço, but the strategic American interest in counterbalancing China and guaranteeing access to key minerals, as well as the exploitation of profitable businesses for a mature economy like the US.

In these terms, the US will most likely maintain a clear interest in Africa and Angola, unlike what happened in Trump’s first term. What is at stake is a structural trend in US foreign policy, which will depend less on its actors and more on its interests.


[1] https://trumpwhitehouse.archives.gov/wp-content/uploads/2020/11/Trump-on-China-Putting-America-First.pdf

[2] https://www.semafor.com/article/11/01/2024/trumps-africa-plans-take-pragmatic-turn-for-election

[3] https://static.project2025.org/2025_MandateForLeadership_CHAPTER-06.pdf

[4] https://www.semafor.com/article/11/01/2024/trumps-africa-plans-take-pragmatic-turn-for-election

[5] https://www.atlanticcouncil.org/blogs/africasource/what-africa-can-expect-under-a-second-trump-administration-a-focus-on-the-numbers/

A vitória de Trump e Angola (análise rápida)

As expectativas e imprevisibilidade de Donald Trump

Para qualquer observador da política angolana pareceu haver um certo alinhamento doméstico em termos de simpatias relativamente às eleições americanas. Ou dito mais expressamente, uma esperança dos sectores antagónicos a João Lourenço numa vitória de Donald Trump, na expectativa que este repetisse a política do seu primeiro mandato de desinteresse em África e logo de arrefecimento com Angola.

Agora que a vitória se consumou, é importante tentar perceber o que se poderá ou não passar, uma vez que está em jogo o novo alinhamento estratégico de Angola com os EUA que, de certa forma, equilibrou a balança de poder no continente africano e igualmente, em concreto, relançou o Corredor do Lobito, projecto abraçado intensamente pelo Presidente Joe Biden.

Obviamente, que antes de 20 de janeiro de 2025 tudo será demasiado especulativo, e, sobretudo, tratando-se de Trump, a imprevisibilidade tem um lugar cimeiro.

Mesmo assim, tem havido suficientes sinais que podem indiciar que, afinal, a atitude de Trump em relação a Angola não será assim tão diferente da política de Joe Biden.

A competição e contenção da China

A primeira razão para a permanência da política é a China. Do ponto de vista geoestratégico a situação atual (2024) é extremamente diferente daquela do primeiro mandato de Trump (2017-2021), designadamente naquilo que diz respeito à competição ou contenção da China, que, lembre-se foi iniciada como tendência estrutural da política externa norte-americana, precisamente, por Donald Trump. A coletânea de discursos de Trump sobre a China nesse mandato “TRUMP ON CHINA • PUTTING AMERICA FIRST” é expressa na sua introdução ao afirmar:

“For decades, Donald J. Trump was one of the few prominent Americans to recognize the true nature of the Chinese Communist Party and its threat to America’s economic and political way of life. Now, under President Trump’s leadership, the United States is taking action to protect our nation and its partners from an increasingly assertive China. We are no longer turning a blind eye to the People’s Republic of China’s conduct nor are we hiding our criticism of its Communist Party behind closed doors”.[1]

(Durante décadas, Donald J. Trump foi um dos poucos americanos proeminentes a reconhecer a verdadeira natureza do Partido Comunista Chinês e a sua ameaça ao modo de vida económico e político dos Estados Unidos. Agora, sob a liderança do presidente Trump, os Estados Unidos estão a tomar medidas para proteger a nossa nação e seus parceiros de uma China cada vez mais assertiva. Não estamos mais a fechar os olhos à conduta da República Popular da China nem a esconder as nossas críticas ao seu Partido Comunista a portas fechadas.)

É neste sentido que alguns dos mais destacados colaboradores de Trump se têm pronunciado. Tibor Nagy, ex-secretário assistente de Estado para Assuntos Africanos de Trump e ex-embaixador na Guiné e Etiópia, insiste que Trump foi o primeiro a aumentar a consciencialização sobre a enorme ameaça que a China representa para os interesses dos EUA na África, e afirma expressamente: “Vocês verão novamente um combate agressivo à influência chinesa na África[2]“.

Admite-se que o foco dessa abordagem transacional, típica de Trump, será começar a bloquear as cadeias de suprimentos para minerais essenciais na África usados ​​para baterias de energia verde usadas em veículos elétricos e telefones. Assim declara o embaixador J. Peter Pham, ex-enviado especial dos EUA para a região do Sahel na África sob Trump,  “Não há como negar que o acesso aos muitos minerais críticos que a África tem em grande abundância é necessário para a economia americana hoje, bem como para as tecnologias que nos levarão ao futuro” e “Além disso, a monopolização das cadeias de suprimentos para esses recursos estratégicos por qualquer país, muito menos uma potência revisionista como a China, é uma ameaça à segurança dos EUA.”

Este sentido geoestratégico de África em que se enquadra Angola é reforçado pela chamado Projeto 2025, uma espécie de doutrina paralela dos ideólogos Trumpistas, de que este se afastou nalguns aspetos, mas não em relação a África. Escreve Kiron K. Skinner nesse documento que o crescimento populacional explosivo da África, grandes reservas de minerais dependentes da indústria, proximidade com as principais rotas de transporte marítimo e o seu poder diplomático coletivo garantem a importância global do continente[3].

A verdade é que uma área da abordagem Biden-Harris que não foi criticada pelos republicanos é  o Corredor de Lobito, o projeto multibilionário de infraestrutura de logística e comunicações que conecta o Porto de Lobito em Angola às minas de minerais essenciais da Zâmbia e da República Democrática do Congo. Observadores americanos de África veem o projeto como um modelo a ser construído ou replicado, principalmente com o objetivo de retomar algum controlo das cadeias de suprimentos de minerais essenciais da China[4].

Portanto, o que resulta duma primeira análise dos pronunciamentos dos aliados de Trump e dos seus próprios interesses e postura em relação à China, é que Angola e o seu Corredor do Lobito ocupam um lugar destacado, e por isso, mantendo-se a atenção de Trump à China, a África e especialmente Angola estarão num nível superior das opções estratégicas EUA, i.e., manter-se-á o interesse norte-americano em Angola.

Oportunidades de negócio

Um segundo aspecto, é o relevo que Trump dá aos números e oportunidades de negócio. É provável, que desta vez, pensando em África e Angola, veja números refletindo o movimento massivo de jovens no continente e de oportunidades para negócios norte-americano. Não é segredo que João Lourenço, ainda que com um sucesso modesto, tem tentado abrir Angola aos negócios mundiais, tornando o país um local apetecível para o investimento externo. É uma longa caminhada. Contudo, Trump poderá ver aqui um mercado para as exportações norte-americanas, como Biden já viu ao nível das telecomunicações e energia solar[5].

Conclusões

Com toda a prudência que a imprevisibilidade de Trump aconselha, bem como o seu desprezo anterior pelo continente africano demonstrou, não se deve antecipar que venha a existir um esfriamento na aproximação entre Angola e os Estados Unidos após 20 de Janeiro de 2025.

Na verdade, o que tem estado em causa da parte dos EUA não é qualquer amizade ou relação pessoal de Joe Biden com João Lourenço, mas o interesse americano estratégico em contrabalançar a China e garantir acesso a minerais fundamentais, bem como a exploração de negócios rentáveis para uma economia madura como a dos EUA.

Nesses termos, os EUA, muito provavelmente manterão um interesse claro em África e Angola, ao contrário do que aconteceu no primeiro mandato de Trump. O que está em causa é uma tendência estrutural da política externa norte-americana, que dependerá menos dos seus atores e mais dos seus interesses.


[1] https://trumpwhitehouse.archives.gov/wp-content/uploads/2020/11/Trump-on-China-Putting-America-First.pdf

[2] https://www.semafor.com/article/11/01/2024/trumps-africa-plans-take-pragmatic-turn-for-election

[3] https://static.project2025.org/2025_MandateForLeadership_CHAPTER-06.pdf

[4] https://www.semafor.com/article/11/01/2024/trumps-africa-plans-take-pragmatic-turn-for-election

[5] https://www.atlanticcouncil.org/blogs/africasource/what-africa-can-expect-under-a-second-trump-administration-a-focus-on-the-numbers/

China’s new strategy for Angola


In November 2010, China and Angola established a strategic partnership.

On March 15, 2024, the two heads of state (Xi Jinping and João Lourenço) announced that they would improve China-Angola relations by promoting a comprehensive strategic partnership.

Despite some problems, relations between Angola and China have always evolved positively. Since 2002, political cooperation and trade between the two countries have reached their peak. But in the case of cooperation and exchange in the area of culture and education, there is still a need to work together.

In the 41 years since diplomatic relations were established, the relationship between the two countries has become an example of friendly South-South cooperation. The deep China-Angola friendship has its origins in the arduous struggle of the two peoples to achieve national liberation. The two sides are naturally good partners and good brothers.

China always adheres to mutual respect and equal treatment. It never attaches political conditions to cooperation and never interferes in Angola’s internal affairs. The two countries have always helped each other, supporting each other on issues concerning fundamental interests and major concerns, jointly safeguarding the international system and multilateralism with the UN as the center.

We have set an example of mutual benefit and win-win cooperation between China and Africa. China-Angola pragmatic cooperation has been continuously developed and consolidated.

I am pleased to tell you that China is a champion of cooperation with Angola in various sectors, such as the largest economic and trade partner, the largest importer of Angolan products, and the main source of investment for Angola. We have set an example of friendship between the people of China and Angola. China has actively supported Angola’s development and provided assistance through various donation projects, such as CINFOTEC Huambo, the Luanda General Hospital, the Agricultural Technology Demonstration Center in Mazozo, and the Venâncio de Moura Diplomatic Academy. The Confucius Institute of the University of Agostinho Neto and other Chinese language educational institutions have given wings to Sino-Angolan cooperation, more and more Chinese films and cultural products and art groups have entered Angola, and the literary works of Angolan writers have been translated in China, helping the people of both countries to better understand each other’s history and culture.

In 2023, high-level exchanges between China and Angola were frequent and close, while interaction at all levels flourished. Visiting Angola were China’s Minister of Foreign Affairs, China’s Minister of Commerce, Cda. Yin Li, member of the Political Bureau of the Central Committee of the Communist Party and Secretary of the Beijing Municipal Committee of the Party, Cda. Su Hui, Vice-Chairman of the Chinese People’s Political Consultative Conference and Chairman of the Central Committee of the Taiwan Democratic Autonomy League. A delegation from the National People’s Assembly came to Angola to take part in the 147th IPU Assembly. Several high-level party and central and local government delegations traveled to China, including the delegation of the Angolan Minister of Industry and Trade to the third edition of the China-Africa Economic and Trade Exhibition and the delegation of the Minister of Energy and Water to the third edition of the Belt and Road Forum for International Cooperation. Angola’s Foreign Minister successfully visited China. China’s Shandong province and Angola’s Bengo province signed a letter of intent for cooperation.

Strategic communication between China and Angola is growing closer, friendship is deepening and cooperation and exchanges in various fields have gained momentum. So far there are 12 more Angolan literary works translated by me, for example, Estórias do Musseque, UANGA, Nga Mutúri, Luuanda, A Montanha da água lilás, Que Me Dera Ser Ondas, A Morte do Velho Kipacaça, Bola com Feitiço, A Dívida da Pexeira, O Principe Merdroso, Undengue, Uma vida sem trégua.

Through works translated into Mandarin, the Chinese people are getting to know Angola. At the same time, the promotion of Angolan tourism can attract more Chinese tourists.

In 2023, there was a lot of good news for China-Angola pragmatic cooperation. The annual volume of bilateral trade reached 23.05 billion US dollars. Angola once again became China’s second largest trading partner in Africa. The second meeting of the China-Angola Economic and Trade Cooperation Steering Committee was successfully held and the Agreement between China and Angola on Reciprocal Investment Promotion and Protection was signed. Progress was made on the major China-Angola infrastructure cooperation projects. The Caculo Cabaça Hydroelectric Plant completed the first phase of the provisional detour of the Kwanza River. The New Luanda International Airport and the Luachimo Hydroelectric Plant were inaugurated. CINFOTEC Huambo, offered by China, was officially handed over to the Angolan government. The New Port of Caio, Angola’s National Broadband Project and the Lobito Refinery are progressing steadily. China-Angola cooperation continues to expand in the energy and mining, manufacturing, agriculture and fisheries sectors, and investment projects have been launched successively, helping Angola to achieve its goal of economic diversification.

In 2023, cultural exchanges between China and Angola were vibrant. The “China-Angola Friendship Day” was celebrated with great success. Journalists, academics and young talents from Angola visited China for friendly exchanges. The Chinese Language Proficiency Contest “Chinese Bridge” and the Reading Contest of Chinese Classical Works were held in Angola. The Confucius Institute at Agostinho Neto University and the Venâncio de Moura Diplomatic Academy jointly opened Chinese language courses. Dozens of Angolan friends won prizes in the #ChinAnGood series of photo and short video competitions. Thousands of people took part in the 2nd Chinese Film Cycle. The Chinese Embassy in Angola, in partnership with the Catholic University of Angola, organized a Conference focused on development, where academics from both countries exchanged ideas, contributing their wisdom to the development and cooperation of our countries. We are very pleased to see that enthusiasm for the Chinese language and culture continues to grow in Angolan society, especially among young people.

It should be noted that the development of the motherland and the deepening of China-Angola relations cannot be separated from the hard work of Chinese companies and institutions and Chinese residents in Angola. We have noted that in the face of separatist activity in pursuit of “Taiwanese independence”, Chinese compatriots in Angola issued early statements of condemnation, strengthening the international voice in support of China’s unification. We have noticed that under the scorching heat of the sun, Chinese builders insist on fighting on construction sites to promote the inauguration and operation of China-Angola cooperation projects with benefits for the local community. We have noticed that during the heavy rains in Angola, Chinese companies and Chinese organizations have voluntarily provided accommodation centers and donations to help the affected community. We have noticed that despite the difference in skin color and language, our compatriots and Angolans are able to relate to each other and create fraternal and brotherly bonds.

China has steadfastly followed the path of peaceful development, actively opening up to the world and participating in global governance. Challenged by the historic question of “what kind of world will we build and how will we build it”, China has put forward the important concept of building a community with a shared future for humanity and has set up the Global Development Initiative, the Global Security Initiative and the Global Civilization Initiative. China joins hands with more than three quarters of the world’s countries to jointly build the “Belt and Road”. It calls for equitable and orderly global multipolarity and economic globalization that benefits all, injecting Chinese wisdom and strength into promoting the world towards a promising future of peace, security, prosperity and progress.

Secondly, the 2024 Summit of the Forum on China-Africa Cooperation (FOCAC) was successfully held in Beijing last month. Heads of State and Government and representatives from 53 African countries met in Beijing to discuss plans for friendly China-Africa cooperation in the new era. The China-Africa relationship has been elevated to a community with a shared China-Africa future of all times in the new era.

The Chinese president announced that over the next three years, China will work with Africa to take the ten partnership actions for modernization, including the ten areas of mutual learning between civilizations, trade prosperity, supply chain cooperation, connectivity, development cooperation, health, agriculture and people’s welfare, people-to-people exchanges, green development and common security. To implement the ten partnership actions, the Chinese government will provide financial support of 360 billion yuan over the next three years. This includes a 210 billion yuan credit line, 80 billion yuan of assistance in different forms, and at least 70 billion yuan of investment in Africa by Chinese companies, providing strong support for pragmatic China-Africa cooperation in various fields.

Therefore, in the coming years, Angola may also have more opportunities for cooperation with China. To make things easier, Angolan entrepreneurs have already been exporting goods to China tax-free since December 2024. Around 98% of Angolan goods imported into China have tax benefits. In this way, Angolan entrepreneurs can earn more foreign currency. 

A nova estratégia chinesa para Angola


Em Novembro de 2010, a China e Angola estabeleceram uma parceria estratégica.

No dia 15 de Março de 2024, os dois chefes de Estado (Xi Jinping e João Lourenço) anunciaram que iriam melhorar as relações China-Angola, promovendo uma parceria estratégica abrangente.

Apesar de alguns problemas, as relações de Angola e China sempre evoluem positivamente. Desde 2002, a cooperação política e as trocas comerciais dos dois países já alcançaram o auge. Mas no caso da cooperação e intercâmbio na área da cultura e educação ainda é necessário trabalhar em conjunto.

Em 41 anos desde o estabelecimento de relações diplomáticas, a relação entre os dois países tornou-se um exemplo de cooperação amistosa Sul-Sul. A profunda amizade China-Angola tem a origem na árdua luta dos dois povos para alcançar a libertação nacional. Os dois lados são naturalmente bons parceiros e bons irmãos.

A China adere sempre ao respeito mútuo e à igualdade de tratamento. Nunca atribui condições políticas à cooperação e nunca interfere nos assuntos internos de Angola. Os dois países sempre se ajudaram um ao outro, apoiando-se mutuamente em questões relativas aos interesses fundamentais e preocupações principais, salvaguardando conjuntamente o sistema internacional e multilateralismo com a ONU como o centro.

Estabelecemos um exemplo de benefício mútuo e de cooperação vantajosa para todos entre a China e África. A cooperação pragmática China-Angola tem sido continuamente desenvolvida e consolidada.

Tenho o prazer de vos dizer que a China é campeã da cooperação com Angola em vários sectores, como por exemplo, o maior parceiro económico e comercial, o maior importador dos produtos angolanos, e a principal fonte de investimento para Angola. Estabelecemos um exemplo de amizade entre os povos China-Angola. A China tem apoiado activamente o desenvolvimento de Angola e fornecido assistência através de vários projectos de doação, tais como o CINFOTEC Huambo, o Hospital Geral de Luanda, o Centro de Demonstração de Tecnologias Agrícolas no Mazozo, e Academia Diplomática Venâncio de Moura. O Instituto Confúcio da Universidade de Agostinho Neto e outras instituições de ensino de língua chinesa deram asas à cooperação sino-angolana, cada vez mais filmes e produtos culturais chineses e grupos de arte entraram em Angola, e as obras literárias dos escritores angolanos foram traduzidos na China, ajudando os povos de ambos os países a compreender melhor a história e cultura um do outro.

Em 2023, os intercâmbios de alto nível entre a China e Angola foram frequentes e estreitos enquanto a interação de todos os níveis floresceu. Visitaram Angola, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da China, o Ministro do Comércio da China, o Cda. Yin Li, membro do Bureau Político do Comité Central do Partido Comunista e Secretário do Comité Municipal de Beijing do Partido, a Cda. Su Hui, Vice-Presidente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês e Presidente do comitê central da Liga de Autonomia Democrática de Taiwan. Uma delegação da Assembleia Popular Nacional veio a Angola participar na 147ª Assembleia da UIP. Diversas delegações de alto nível de partido e do governo central e local deslocaram-se à China, incluindo a delegação do Ministro da Indústria e Comércio de Angola para a terceira edição da Exposição Económica e Comercial China-África e a delegação do Ministro da Energia e Águas à terceira edição do Fórum Cinturão e Rota para Cooperação Internacional. O Ministro das Relações Exteriores de Angola visitou a China com sucesso. A província de Shandong da China e a província do Bengo de Angola assinaram uma carta de intenções de cooperação.

A comunicação estratégica entre a China e Angola está a aproximar-se cada vez mais, a amizade está a aprofundar-se e a cooperação e os intercâmbios em vários domínios ganharam um novo fôlego. Até agora há mais 12 obras literárias angolanas traduzidas por mim, por exemplo, Estórias do Musseque,UANGA, Nga Mutúri,Luuanda, A Montanha da água lilás, Que Me Dera Ser Ondas, A Morte do Velho Kipacaça, Bola com Feitiço, A Dívida da Pexeira,O Principe Merdroso ,Undengue, Uma vida sem trégua.

Através das obras traduzidas em mandarim, o povo chinês começa a conhecer Angola. Ao mesmo tempo, a promoção do turismo angolano pode atrair mais turistas chineses.

Em 2023, registaram-se muitas novidades boas para a cooperação pragmática China-Angola. O volume anual de comércio bilateral atingiu 23,05 mil milhões de dólares americanos. Angola voltou a ser o segundo maior parceiro comercial da China em África. Foi realizada com sucesso a segunda Reunião da Comissão Orientadora de Cooperação Económica e Comercial China-Angola e foi assinado o Acordo entre a China e Angola sobre Promoção e Protecção Recíproca de Investimentos. Os grandes projectos de cooperação China-Angola em matéria de infra-estruturas tiveram progressos. O Aproveitamento Hidroeléctrico de Caculo Cabaça concluiu a primeira fase do desvio provisório do rio Kwanza. Foram inaugurados o Novo Aeroporto Internacional de Luanda e o Aproveitamento Hidroeléctrico de Luachimo. Foi oficialmente entregue ao governo angolano o CINFOTEC Huambo oferecido pela China. Estão a avançar de forma constante o Novo Porto do Caio, o Projeto Nacional de Banda Larga de Angola e a Refinaria do Lobito. Continua a expandir-se a cooperação China-Angola nos sectores da energia e da exploração mineira, da indústria transformadora, da agricultura e das pescas, os projectos de investimento têm vindo a ser lançados sucessivamente, apoiando Angola a atingir o objetivo da diversificação económica.

Em 2023, os intercâmbios culturais entre a China e Angola foram vibrantes. O “Dia da Amizade China-Angola” foi comemorado com grande sucesso. Jornalistas, académicos e jovens talentos de Angola visitaram a China para intercâmbios amigáveis. O Concurso de Proficiência em Língua Chinesa “Chinese Bridge” e o Concurso de Leitura das Obras Clássicas Chinesas foram realizados em Angola. O Instituto Confúcio na Universidade Agostinho Neto e a Academia Diplomática Venâncio de Moura abriram juntos cursos de língua chinesa. Dezenas de amigos angolanos ganharam prémios na série de concursos de fotografia e de vídeos curtos #ChinAnGood. Milhares de pessoas participaram no 2º Ciclo de Cinema Chinês. A Embaixada da China em Angola, em parceria com a Universidade Católica de Angola, organizou uma Conferência focada no desenvolvimento, onde académicos dos dois Países trocaram ideias, contribuindo com sua sabedoria para o desenvolvimento e cooperação dos nossos Países. É com muita satisfação que verificamos que o entusiasmo pela língua e cultura chinesas continua a crescer na sociedade angolana, especialmente entre os jovens.

É de salientar que o desenvolvimento da pátria e do aprofundamento das relações China-Angola não se separam do trabalho árduo das empresas e instituições chinesas e dos chineses residentes em Angola. Temos notado que perante a atividade separatista em busca da “independência de Taiwan”, os compatriotas chineses em Angola emitiram na primeira hora declarações de condenação, reforçando a voz internacional ao apoio da unificação da China. Temos notado que sob o calor escaldante do sol, os construtores chineses insistem em lutar nas obras para promover a inauguração e funcionamento dos projectos de cooperação China-Angola com benefícios para a comunidade local. Temos notado que aquando das chuvas fortes em Angola, as empresas chinesas e as organizações chinesas providenciaram voluntariamente centros de alojamento e doações para ajudar a comunidade afectada. Temos notado que apesar da diferença de cor de pele e de língua, os nossos compatriotas e os angolanos são capazes de se relacionar uns com os outros e de criar laços fraternos e fraternais.

A China seguiu inabalavelmente o caminho do desenvolvimento pacífico, ativamente se abrindo ao mundo e à participando na governação global. Desafiada pela interrogação histórica de “que tipo de mundo construiremos e como o construiremos”, a China propôs o importante conceito de construir uma comunidade com futuro compartilhado para a humanidade e levantou a Iniciativa para o Desenvolvimento Global, a Iniciativa para a Segurança Global e a Iniciativa para a Civilização Global. A China dá as mãos com mais de três quartos dos países do mundo para construir em conjunto o “Cinturão e Rota”. Apela à multipolaridade global equitativa e ordenada e à globalização económica que beneficie todos, injectando a sabedoria e a força chinesa na promoção do mundo rumo a um futuro promissor de paz, segurança, prosperidade e progresso.

Em segundo lugar, a Cimeira de 2024 do Fórum de Cooperação China-África (FOCAC) foi realizada com sucesso em Beijing no mês passado. Os Chefes de Estado e de Governo e representantes de 53 países africanos reuniram-se em Beijing para abordar os planos para a cooperação amistosa China-África na nova era. A relação China-África foi elevada para uma comunidade com futuro compartilhado China-África de todos os tempos na nova era.

O presidente chinês anunciou que, nos próximos três anos, a China trabalhará com África para tomar as dez ações de parceria para modernização, incluindo as dez áreas, que são a aprendizagem mútua entre civilizações, prosperidade comercial, cooperação de cadeia produtiva, conectividade, cooperação de desenvolvimento, saúde, agricultura e o bem-estar do povo, intercâmbio entre os povos, desenvolvimento verde e de segurança comum. Para implementar as dez ações de parceria, o governo chinês fornecerá apoio financeiro de 360 mil milhões de yuan, nos próximos três anos. Isso inclui uma linha de crédito de 210 mil milhões de yuan, 80 mil milhões de yuan de assistência em diferentes formas, e pelo menos 70 mil milhões de yuan de investimento em África por empresas chinesas, proporcionando um forte apoio à cooperação pragmática China-África em vários domínios.

Por isso, nos próximos anos, Angola também pode conseguir mais oportunidades de cooperação com a China. Para facilitar, os empresários angolanos já exportam mercadorias para a China, desde o mês de Dezembro de 2024, isentas de imposto. Cerca de 98% das mercadorias angolanas importadas pela China têm benefícios fiscais. Assim, os empresários angolanos podem ganhar mais divisas. 

The need for a joint African Union mechanism for Africa’s debt to China

The framework and problems of debt to China in Africa

Africa is a continent that is mentioned many times because of its vast natural wealth. Unfortunately, this is not reflected in the wealth of the African populations, who consequently suffer a variety of deprivations.

In this context, the issue of the debt owed by African countries to China is taking on somewhat worrying contours. The loans taken out by sub-Saharan African countries from China have seen a major boost, especially since the Road and Belt Initiative (RBI) was established in 2013. This ambitious Chinese initiative, whose main driving force was President Xi Jinping, aimed to increase the country’s economic and geopolitical influence. And while loans grew dramatically in 2013 with 17.5 billion dollars, and even peaked in 2016 with 28.4 billion dollars, in the following years the drop in loan amounts was incessant, reaching 1.2 billion in 2021, and the following year totalling just 994 million dollars (a total of 9 loans), making it the lowest level of Chinese loans since 2004.[1]

Fig.1 – Annual evolution of Chinese loans to Africa (billions of dollars)

Source: Chinese Loans to Africa Database, Boston University

The channelling of this Chinese money into development in Africa, specifically in the financing of various infrastructure projects and other ventures, has stimulated some African economic growth. However, there have been several “grey clouds”, many of which are clearly visible in the Angolan economy, but which also stand out in other countries. This translates into an often undisguised unease in Sino-African relations. Some countries have even become hostages to the so-called “debt trap diplomacy”. China, by unleashing the RBI, provoked the idea of facilitating loans to other developing economy states, and indeed, this ended up making the Asian country the largest international creditor. However, these loans have often lacked transparency: cases of corruption have multiplied, often because the financing did not go through public tender processes. The problem of the so-called ‘hidden debt’ arose when “China stopped lending to central governments and state-owned or state-supported companies. These debts do not appear on government balance sheets, although governments are often responsible for them if the official debtor is unable to pay.”[2]

You might think that this situation could eventually benefit the Chinese, since they have several countries “stuck” with monstrous debts. However, this is not the case, because at the same time, China is facing very serious domestic economic problems, which, until they are solved, will make it difficult to promote a reduction in foreign debt at the same time. [3]

Indeed, the slow recovery from the pandemic, the problem of youth unemployment, and the collapse of the property sector have shaken what seemed to be China’s unshakeable growth. This is how Christoph Nedopil, founder and director of the Chinese think tank Green Finance and Development Centre (GFDC), argues: “it will be a domestic challenge for China to simultaneously promote debt reduction abroad as long as domestic economic problems are not fully resolved.”[4]

In December 2022, Chatham House published a report analysing the development of the model of Chinese loans to African states (2000-2020), which were initially based on providing resources, and then evolved into more strategic or business-oriented choices.

Fig 2: Top 10 recipients of Chinese loans in Africa, 2000-20

Source: Chatham House: https://www.chathamhouse.org/2022/12/response-debt-distress-africa-and-role-china/02-case-studies-chinese-lending-africa

It should be noted, however, that from 2021 onwards the Asian country’s orientation changed, for reasons already mentioned, and also because several states were not meeting their payments. The Chinese leadership changed course and stopped investing in large projects, such as railways and motorways, to focus on smaller loans with a more beneficial social and environmental impact. The climate agenda was another factor to enter the equation.[5]

In addition, the money began to change direction; previously most of the loans went to countries in East and Southern Africa. From 2021-22 there was a shift towards West Africa, with countries like Senegal, Benin and Côte d’Ivoire receiving most of the money.[6]

Many African states and others have defaulted on their debts, so it was imperative that ways were found to resolve China’s so-called ‘odious debt’.

According to the International Monetary Fund (IMF), the world’s most indebted poor countries have all borrowed heavily from China. This situation, as we have already mentioned, may constitute “debt trap diplomacy”, in which China deliberately grants loans to countries it knows it cannot repay, in the hope of gaining political influence.[7]

What we saw last year was a growth in Chinese exports to Africa, which reached 173 billion dollars, an increase of 7.5 per cent compared to 2022, while its imports from the continent fell by 6.7 per cent to 109 billion dollars (data provided by the Chinese General Administration of Customs).

Although the annual increase of 100 million dollars made bilateral trade in 2023 a record, Africa’s trade deficit with China continued to rise, from 46.9 billion dollars in 2022 to 64 billion dollars last year.[8]

In 2022, 60 per cent of China’s debtor nations were in financial difficulties, compared to 5 per cent in 2010.[9]

How have some of these African nations dealt with this debt problem, and how has China changed its behaviour over time?

Let’s analyse a few cases:

Zambia:

The Middle Kingdom has been tough in the debt restructuring negotiations, and the situation, despite all the constraints, is not worse because other actors are gaining prominence, not just states, such as economic institutions like the IMF or the World Bank, or organisations that promote international negotiation and dialogue, such as the G20.

In the case of Zambia, which is the continent’s largest copper producer, it was the first sovereign nation in Africa during the pandemic to default when it failed to make a bond payment of 42.5 million dollars. The debt ended up preventing the country from developing economically and taking on new projects. So, in June 2023, Zambia and its creditors, including China, finally reached an agreement within the G20 Common Framework to restructure 6.3 billion dollars in loans.[10] This relief was limited to deadline extensions and a grace period on interest payments, but in order to reach a consensus there were no debt cuts,

However, in November there were already disagreements, as the Zambian government announced that a revised agreement to rework 3 billion dollars in eurobonds could not be implemented due to objections from official creditors, including China.

These problems in restructuring Zambia’s debt, which had been negotiated within the G20 Common Framework, ended up greatly undermining the negotiations and further delaying debt restructuring, putting the lives of ordinary Zambians in ever greater agony.[11]

Ghana:

At the beginning of last year, Ghana owed China 1.7 billion dollars, according to the International Institute of Finance, a financial services trade association focused on emerging markets.[12] Like Zambia, Ghana went into sovereign default on 60 billion dollars in domestic and external debt at the end of 2022 and sought a resolution to this problem soon afterwards under the Common Framework for official external debt of 5.4 billion dollars.[13]

An agreement was reached with the official creditors to restructure the debt, along the same lines as Zambia. However, although this agreement has unlocked an IMF loan, progress has been slow.

Currently, according to some sources, “Ghana intends to carry out a simple debt restructuring, exchanging old bonds for new notes, at a time when the country is seeking to relieve a debt of around 13 billion dollars owed to international private creditors”.[14] However, the information provided has been contradictory, which is why the Ghanaian government has been cautious about a debt overhaul that would include a gradual reduction, in which bondholders would receive less if macroeconomic results were not as good as expected.[15]

Nevertheless, the government has told investors that it would like to reach a solution following the agreement on public debt reached with creditors such as the Paris Club and China.

Ethiopia:

Ethiopia is the second most populous country in Africa and the tenth largest in terms of area, but it is also one of the African states experiencing the greatest geopolitical, military and economic turbulence. The proximity to the Chinese state goes back a long way. Ethiopia recently signed several bilateral agreements with several of its official creditors, including China itself. With low foreign currency reserves, which have been a constant problem in the country, and high inflation, it has reached bilateral agreements to suspend debt servicing. With China, it obtained a two-year debt suspension, which is quickly being cancelled. Ethiopia has 28.2 billion dollars in foreign debt, half of which is Chinese. According to the African Development Bank, Ethiopia’s GDP is expected to grow by 5.8 per cent in 2023 and 6.2 per cent in 2024, mainly on the basis of industry, consumption and investment. On the other hand, inflation reached 34 per cent in 2022. Due to high defence spending and declining revenue collection, the budget deficit was 4.2% of GDP in 2022.[16] Against this backdrop, Ethiopia needs development support, debt relief and Foreign Direct Investment.[17]

The Angolan situation

Angola’s debt to China is older than the Belt and Road initiative of 2013. It began to develop after the end of the Civil War in 2002, with China becoming the main financier of the reconstruction that followed. At the moment, according to official data from the National Bank of Angola (BNA), Angola’s public debt stock in relation to China is 18.4 billion dollars (billions in Anglo-American terms), corresponding to 37 per cent of the total debt. What’s more, the figures show that between 2019 and 2023 this amount fell from 22.4 billion to 18.4 billion. This means that, in four years, Angola has paid – in capital alone, not counting interest – 4 billion dollars to China[18] . Everyone has noticed the weight that public debt payments have on the state budget, and there were serious problems with Angola’s public finances in 2023, and it is expected that the same will happen in 2024, especially from March onwards, given the need for payments to China.

Although we don’t believe that the payment of the debt to China jeopardises the solvency of the Angolan state, we do believe that it has a very significant crowding out effect, since it removes resources from the General State Budget that could be earmarked for development and the social sector to pay off debt, debt that is controversial to some extent, since the loans were used in a very questionable way: Part of that debt was earmarked for disposable infrastructure, such as stadiums and roads that today are in a precarious condition. In addition, a significant portion of these loans ended up being privately appropriated by Angolan leaders, damaging the country’s economy.

There is a clear Angolan problem with Chinese debt, which, as we have just briefly described, also exists in relation to other African countries.

Fig. 3 – Chinese loans to Africa and Angola (in USD$ billion)

Source: China Africa Research Initiative – Johns Hopkins University (https://www.sais-cari.org/) 

The creation of a common mechanism within the African Union (AU) to negotiate Chinese debt

Since the Chinese debt is an African issue, it should no longer be dealt with bilaterally, as it is clear that each state on its own may be too weak to negotiate with China, one of the world powers of today, or to appear alone in the organisations promoted by the creditors. The creditors unite, while the African countries face them individually without support.

It would be important for the Conference of the African Union, the AU’s supreme body made up of heads of state and government (Article 6 of the AU’s Constitutive Act), to set up a Joint Chinese Debt Negotiation Committee (Article 6(d)), mandated to negotiate with the Chinese authorities a global framework for readjusting Africa’s debt to China, which would then be applied to all those seeking debt relief.

It is clear that negotiating Africa’s debt with China is a complex process that involves interaction between different parties with different interests and objectives. In order to achieve success, it is essential to consider African unity in demanding Chinese co-operation. This unity means, from the outset, gathering information and obtaining as many elements as possible for the negotiation, which a joint body can facilitate. In complex negotiations, time and the ability to understand the other person are fundamental aspects, and in this sense, a unified African solution will allow for a much greater exchange of experiences and, at the same time, a more technical, less emotional and more ‘negotiatingly’ weighty follow-up to the negotiation.

It is essential that Africa draws up a joint policy to deal with Chinese debt on an equal footing and not from a position of weakness.

A clear solution is to pass all the negotiations through a united African body within the African Union, becoming an enlarged African Union-China negotiation. This would also make it possible to strengthen the unity of the cradle continent.


[1] https://www.reuters.com/world/africa/chinese-loans-africa-plummet-near-two-decade-low-study-2023-09-19/

[2] Africa Defence Forum Magazine: https://adf-magazine.com/pt-pt/2022/02/dividas-com-a-china-colocam-20-paises-africanos-em-dificuldades-financeiras/

[3] https://www.bbc.com/portuguese/articles/cmj544lg205o

[4] idem

[5] https://www.voanews.com/a/china-s-lending-to-africa-hits-a-low-study-shows/7280214.html

[6] idem

[7]  Visual Capitalist: https://www.visualcapitalist.com/countries-loans-from-china/

[8] South China Morning Post: https://www.scmp.com/news/china/diplomacy/article/3250552/china-africa-trade-hit-282-billion-2023-africas-trade-deficit-widens-commodity-prices-key-factor

[9] Visual Capitalist: https://www.visualcapitalist.com/countries-loans-from-china/

[10] Associated Press: https://apnews.com/article/zambia-debt-restructuring-deal-china-a0d14e7af986e2f873555685cedb86b3

[11] Afronomics Law: https://www.afronomicslaw.org/category/african-sovereign-debt-justice-network-afsdjn/one-hundred-and-fourth-sovereign-debt-news

[12] https://www.reuters.com/world/africa/china-says-its-official-bilateral-loans-are-less-than-5-ghana-debt-2023-03-02/

[13] Economist Intelligence: https://www.eiu.com/n/china-and-africas-long-road-to-debt-recovery/

[14] https://www.reuters.com/markets/rates-bonds/ghana-pushes-simple-debt-rework-proposal-bondholders-sources-2024-01-30/

[15] idem

[16] Observer Research Foundation: https://www.orfonline.org/research/the-changing-face-of-ethiopia

[17] idem

[18] Rui Verde, https://www.makaangola.org/2024/01/angola-eua-trump-e-divida-a-china/